Terça-feira, 26 de Agosto de 2014

Complemento a Inteligência artificial e o pensamento

Complemento a Inteligência artificial e o pensamento

 

Para melhor enquadrar o presente artigo, resume-se inicialmente o meu artigo Inteligência artificial e o pensamento ( Resende, 2014 ), para depois se fazer um complemento ao mesmo, que apoia as ideias descritas nesse artigo.

 

Assim, no artigo mencionado, descreve-se uma contribuição das ciências psicanalíticas para as ciências da computação, e em particular para a inteligência artificial.

 

Começando pela noção mais contemporânea nas ciências da computação, de computação quântica e de estados sobreimpostos, superimpostos ou sobrepostos, diremos que estes dizem respeito à consideração lógica da simultaneidade do estado falso e estado verdadeiro de uma asserção, mas antes de ser medido, pois quando medido ou observado o sistema se mostra em um único estado, como se pode ver na Wikipédia, em Sobreposição Quântica. Mais especificamente, a sobreposição dos estados é nulificada e o valor esperado de um operador é o valor esperado do operador nos estados individuais, multiplicado pela fracção do estado sobreposto que está nesse estado, como se pode ver na Wikipedia, em Quantum Superposition. Repare-se que, como muito importante, já se fala aqui em nulificação de um estado ou sua sobreposição, apelando eu a seguir a uma extensão desta noção.

 

Considera-se, depois, uma contribuição das ciências psicanalíticas para a computação, e em particular para a inteligência artificial.

 

Assim, temos o não enquanto organizador psíquico, com a noção psicológica da negatividade de uma asserção, e temos o não-seio, enquadrado na teoria do pensar de Wilfred Bion, em que temos o pre-conceito associado a uma frustração dando origem ao conceito, em que o não-seio é potenciador e criador de pensamento, tendo origem na noção de que o bebé quando frustrado quanto baste em relação à necessidade do seio materno potenciará o seu pensamento, tendo o mesmo como falta da satisfação desejada, como se pode ver em O pensamento clínico de Wilfred Bion, de Symington & Symington.

 

Deste modo, em termos de inteligência artificial, ao nível da computação, chegamos à noção de estados subimpostos, em que quer o estado verdadeiro quer o estado falso são negados, levando-nos à noção de que essa negação estará relacionada com o tempo lógico, no sentido de ser uma negação e estados temporalmente provisórios. Em termos de pensamento, em particular de pensamento científico, remete-nos para a noção de Karl Popper da provisoriedade das verdades científicas e no sentido de elas serem refutáveis. Isto fará caracterizar uma inteligência artificial com um pensamento de nível científico, uma inteligência artificial enquanto cientista. Para mais, naquela temporalidade provisória da negação e estados subimpostos, e ao nível de uma árvore de decisões computacional, teríamos que aquela negação inicial levaria a uma regressão na árvore, com reinício do processo, em que teríamos uma espécie de tentativa e erro. Com um processo continuado de negações e reinícios, teríamos algo ao nível da reflexão, de uma capacidade reflexiva, em que tendo em conta o registo em memória das tentativas, e seus resultados, teríamos algo ao nível de uma aprendizagem, de uma capacidade de aprender. Diz-se mais, que no seguimento é importante referir outro desenvolvimento Bioniano, que é a ideia de os pensamentos estarem à “ espera “ do pensador para os pensar, e isto no contexto teórico de os conteúdos do pensamento, para Bion, surgirem antes do continente, ou aparelho para pensar, tornando isto mais valorativo o input computacional. É de dizer que embora a resposta seja importante, a pergunta é essencial. Estas considerações vão na linha da importância atribuída à introjecção, na vida mais precoce do bebé, no enquadramento da perspectiva teórica das relações de objecto internalizadas, perspectiva micro-sociológica, e não psicogenética, esta mais Kleiniana, que valoriza mais a projecção inicial na vida precoce do bebé.

 

Continuando o resumo, é de dizer que os processos já descritos fazem-nos lembrar um mecanismo de defesa mais tipicamente obsessivo, o juízo de condenação, que, remetendo para a capacidade de adiar a gratificação, é descrito em Vocabulário da Psicanálise, de Laplanche & Pontalis, como uma operação ou atitude pela qual o inidivíduo, ao tomar consciência de um desejo, a si mesmo proíbe a sua realização, principalmente por razões morais ou de oportunidade. Para mais, Daniel Lagache, citado no mesmo livro, caracteriza este juízo ao nível do adiamento da satisfação, modificação dos alvos e dos objectos, tomada em consideração das possibilidades oferecidas pela realidade ao indivíduo e dos diversos valores em jogo e compatibilidade com o conjunto das exigências do indivíduo, sendo, como é de ver, características muito apropriadas para um funcionamento computacional de uma inteligência artificial, em particular a consideração das possibilidades e diversos valores em jogo. Coerentemente para nós, é dito no mesmo livro que para S. Freud o juízo de condenação é um avatar da negação, em que o não é a sua marca, só se tornando possível graças à criação do símbolo da (de)negação, conferindo ao pensamento um primeiro grau de independência, quer em relação às consequências do recalcamento quer em relação à compulsão do princípio do prazer, ou traduzindo computacionalmente, às necessidades mais imediatas, podendo nós pensar, por exemplo, em necessidades energéticas, no sentido da eficiência energética, como o desligar temporariamente sistemas que não estejam a ser precisos, estando isso representado exemplarmente no save screen ou protecção de ecrã dos computadores normais. Vemos aqui novamente o factor temporal, que se liga a um tipo de recalcamento, e à independência em relação a este.

 

Acabando o resumo, teríamos, no todo, com estados quânticos subimpostos, com negação simultânea do estado falso e do verdadeiro, a possibilidade da criação de uma inteligência artificial com capacidades pensativas ao nível científico, com potencialidade de capacidade reflexiva e capacidade de aprender, com um mecanismo de defesa em todo ele semelhante ao humano.

 

Mais para o presente artigo, e voltando-nos mais especificamente para a tentativa e erro mencionada, com processos continuados de negações e reinícios, levando à eventual capacidade reflexiva e de aprendizagem, veja-se, no que diz respeito à computação, e à tentativa e erro, o exemplo dado na Wikipedia ( Trial and error, Wikipedia ), em que se considera que tentativa e erro é um método fundamental para resolver problemas, caracterizado por tentativas repetidas e variadas que continuam até se obter sucesso, ou até o agente parar de tentar. Em geral, é um método não sistemático que não emprega insight, teoria ou metodologia organizada. Sendo um método heurístico de resolver problemas ou de obter conhecimento, no campo das ciências da computação este método é chamado de gerar e testar. Como já se disse, sendo uma abordagem que pode ser vista como uma de duas abordagens básicas de resolver problemas, contrastando com a abordagem usando insight e teoria, tem-se em conta, contudo, que há métodos intermediários que, por exemplo, usam teoria para guiar o método, uma abordagem conhecida como empirismo guiado. Como é de ver, é esta intermediação que se relaciona com o que propus no primeiro artigo referido, da Inteligência artificial e o pensamento.

 

Noutra referência, no Website                                                                   chessprogramming                                                   ( https://chessprogramming.wikispaces.com/ Trial+and+error ), é ainda avançado que, em geral, a tentativa e erro não faz qualquer tentativa de descobrir porque uma solução funciona, verificando apenas de que é uma solução, o que é uma base interessante para reflectir, particularmente porque nesse sentido há recuperação temporal relativamente à maior perda de tempo que implica a abordagem de tentativa e erro, relativamente a outras abordagens, especialmente aquelas de bases eminentemente teóricas.

 

Ainda sobre este assunto, temos a contribuição especial de um artigo publicado na Biblioteca da Universidade de Cornell, com o título On the Complexity of Trial and Error, pelos autores Xiaohui Bei, Ning Chen e Shegyu Zhang. Foi submetido a 6 de Maio de 2012, numa primeira versão, com uma revisão publicada a 18 de Abril de 2013 ( Bei, Chen & Zhang, 2013 ). Assim, em relação a certas aplicações da física, bioquímica, economia, mas mais pertinentemente para nós, das ciências da computação, em que os objectos de investigação não estão acessíveis por várias limitações, os autores propõem um modelo de tentativa e erro para examinar algoritmos nessas situações. Avançam que dado um problema de pesquisa com um input escondido, é pedido achar-se uma solução válida, para as quais se podem propor soluções candidatas           ( tentativas ), e usando violações observadas ( erros ), para preparar futuras propostas. É considerada uma classe abrangente de problemas de satisfação constrangida, assumindo que os erros são assinalados por um oráculo de verificação no formato de um índice de constrangimento violado. Ainda é de dizer que o modelo dos autores investiga o valor da informação, e os seus resultados demonstram que a falta de informação de input pode introduzir vários níveis de dificuldade extra, em que o modelo exibe conexões íntimas com certas teorias existentes de aprendizagem e de complexidade, esperando que seja um suplemento útil às mesmas.

 

As limitações e os constrangimentos referidos estarão associados, proponho eu, na computação e inteligência artificial, às dificuldades de desconhecimento do funcionamento mais optimal de uma inteligência artificial, em que o modelo dos autores investigando o valor da informação, concluindo que a falta de informação de input introduz dificuldades extra e propondo precisamente o seu modelo de tentativa e erro, que esperam poder suplementar certas teorias existentes de aprendizagem e de complexidade, vem-nos dizer que a tentativa e erro é um bom modelo para lidar com falta de informação de input, enquanto limitação e constrangimento, realçando o valor do input informacional, computacional, na inteligência artificial, como propus no artigo mencionado anteriormente, com a relação que estabeleço desse input com os conteúdos do pensamento relativamente ao aparelho de pensar, no contexto da teoria do pensar de Bion.

 

Como é de ver, a contribuição dos autores agora referenciados vem apoiar a minha proposta, que fiz no artigo já referenciado, enquanto que a minha contribuição, em particular, ao nível das descrições propostas da tentativa e erro, complementa aqueles autores, e em que as relações que estabeleço baseadas na contribuição psicanalítica e ao nível dos estados subimpostos suplementam os mesmos.

 

 

Bibliografia

 

Resende, S. ( 2014 ). Inteligência artificial e o pensamento em www.psicologado.com   ( proposto a 01/2014 )

 

 

Referências de Internet

 

Bei, X., Chen, N. & Zhang, S. ( 2013 ). On the Complexity of Trial and Error in Cornell University Library, arXiv:1205.1183v2[cs.cc], em arxiv.org/abs/1205.1183, consultado em 28/06/2014

 

Chessprogramming in https://chessprogramming.wikispaces.com/ Trial+and+Error, consultado em 28/06/2014

 

Wikipedia. Trial and Error in en.wikipedia.org/wiki/Trial_and_error, consultado em 28/06/2014 

publicado por sergioresende às 12:29
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Domingo, 10 de Agosto de 2014

Generosidade fálica na mulher: sua importância no seu poder criativo

Generosidade fálica na mulher: sua importância no seu poder criativo

 

Para melhor enquadrar o presente artigo, resume-se parte de um artigo meu, Inveja do clitóris e criatividade ( Resende, 2014 ), para depois se elaborar acerca da generosidade fálica na mulher, com sua importância no poder criativo da mesma.

 

Este resumo inclui a indicação da importância do distanciamento relacional do pai em relação à mãe e do útero feminino enquanto espaço de ilusão e da identificação com o pai, figura paterna, enquanto tempo de desilusão, com saída da relação omnipotente anterior, promovendo a criatividade.

 

Assim, nesse artigo, refere-se outro artigo meu, A inveja do pénis e a inveja do clitóris e suas implicações políticas, onde avanço que a inveja do clitóris, na comparação pénis-clitóris, se caracteriza pelo sentimento de subcompensação narcísica, em que há uma necessidade de tentativa de diminuição narcísica, com características contrárias ao falismo. Sendo uma inveja mais tipicamente masculina, é mais característica do obsessivo e de um sistema político mais obsessivo como o comunismo.

 

Há ainda referência a outro artigo meu, Aspectos criativos e evolutivos da inveja do clitóris, onde é indicado que a subcompensação narcísica, característica da inveja do clitóris, deriva do sentimento de superioridade narcísica advindo da comparação pénis-clitóris. Para mais, indica-se que a tentativa de diminuição narcísica, mais típica no homem, terá uma crucial importância evolutiva no sentido do estabelecimento e manutenção de relações amorosas e sexuais, entre homens e mulheres. Estas últimas caracterizar-se-ão sobretudo pela inveja do pénis, com tentativas de sobrecompensação falo-narcísicas correspondentes, baseadas em raiva narcísica, que surgirá do sentimento de perda falo-narcísica do pénis, que é reforçado pela menstruação, que introduz aspectos depressivos de perda já concretizada. Ainda relativamente à subcompensação narcísica do homem como base e origem da psique humana, considera-se a expressão bíblica: “ No princípio era o Verbo! “. Ora, psicanaliticamente considera-se que Deus não é mais do que um pai exacerbadamente idealizado, sendo a ideia religiosa de Deus uma criação humana baseada na exacerbação das características paternas. Temos ainda a noção psicanalítica de que são as ideias de parentalidade e parentais da mãe e do pai, relativamente ao filho, que estão na base da concepção do filho, em particular, desejo genuinamente parental de ter um filho. Em relação a este desejo genuíno, entra a tomada de iniciativa, efectiva, na aproximação amorosa e sexual entre mulher e homem. Tradicionalmente, e tendencialmente, esta tomada de iniciativa efectiva é feita pelo homem e não pela mulher. Enquadra-se, depois, esta iniciativa masculina no meu artigo Masturbação feminina no dia-a-dia: suas implicações psicológicas e comportamentais, onde se conclui que as características masturbatórias femininas do dia-a-dia têm como consequência a diminuição da tomada de iniciativa efectiva na aproximação amorosa e sexual. Tem-se, então, que para surgir o filho terá que haver primeiro esta aproximação sexual entre homem e mulher e tenderá a ser o homem a ter a iniciativa. Assim, a expressão bíblica “ No princípio era o Verbo! “, dirá respeito, sobretudo, à tomada de iniciativa verbal por parte do homem em relação à mulher, para uma aproximação sexual, em que posteriormente surgirá o filho. Tenha-se ainda a noção de que a tendência evolutiva daquela tomada de iniciativa verbal como que é sintetizada no pai e na mãe, do filho em consideração. Perspectiva-se, para mais, a influência verbal do pai para a criança, ainda no útero da mãe, considerando-se aqui a noção das características introjectivas do início e primeiras fases do desenvolvimento psíquico humano, em que o bebé no útero introjecta as tendências evolutivas de maior poder criador e criativo do homem, pelas tendências históricas desse poder, que baseará as características subcompensatórias do homem, na comparação com a falta de poder histórica da mulher.

 

Ainda do artigo inicialmente mencionado, cito outro artigo meu, Influência da inveja do clitóris na sistematização política por género. No mesmo, avanço que a mulher se caracterizará tanto pela inveja do pénis como pela inveja do clitóris, considerando que baseando o sistema histérico de relacionamentos, com a histeria mais típica da mulher, está a inveja que cada mulher sentirá da excitação sexual que o clitóris, de outra mulher, proporciona a essa mulher, nos relacionamentos sociais particularmente sexualizados entre mulheres. Diz-se mais, que o poder criativo diminui na mulher quanto mais se dilui esta inveja do clitóris nos relacionamentos histéricos típicos na mulher, particularmente sexualizados, dizendo-se ainda que para que a mulher sinta verdadeiro poder criativo e criador, deverá dessexualizar os relacionamentos, invertendo a histeria relacional, através da concentração da inveja do clitóris.

 

Continuando o resumo referido, cito ainda outro artigo meu, O poder criativo e as características subcompensatórias do homem derivadas da inveja do clitóris: culpabilidade fálica, onde se diz que a inveja do clitóris surgirá da culpabilidade fálica, em relação ao sentimento de superioridade sentido pelo homem na comparação pénis-clitóris, com possíveis motivos filogenéticos, num sistema de equilibração evolutivo em relação ao sentimento de inveja do pénis, tipicamente sentido pela mulher, e suas características sobrecompensatórias. Culpabilidade fálica, precisamente, em relação às características sobrecompensatórias associadas ao sentimento de superioridade referido. Diz-se ainda que considerando que o homem verdadeiramente criativo não se caracteriza pelo exibicionismo nem pela vaidade, características tipicamente fálicas, diz-se então que faz sentido quando se diz que o artista prefere que os outros não vejam a sua obra antes de ela estar acabada, controlando, precisamente, exibicionismos e vaidades.

 

Ainda do resumo, tem-se outro artigo meu, O pénis enquanto objecto transicional na criatividade, onde se indica que a inveja do clitóris, e suas características subcompensatórias, surgirá, importantemente, do reconhecimento do homem do poder inspirador que lhe surge através da identificação com as mulheres. Para mais, destaca-se, quanto à inveja do clitóris, que a subcompensação narcísica, presente nessa inveja, caracteriza-se por uma tentativa de diminuição narcísica, derivada do sentimento de superioridade narcísica advindo da comparação pénis-clitóris. Ter-se-á, então, em conta que o sentimento de superioridade narcísica referido estará relacionado com o sentimento de masculinidade. Ora, tem-se que a tentativa de diminuição narcísica surgirá no sentido da diminuição do sentimento de masculinidade, diminuição esta que terá importância evolutiva nas relações entre homens e mulheres. Tendo em conta que há um sentimento de masculinidade inicial, derivado da comparação pénis-clitóris, dir-se-á que as características subcompensatórias que caracterizam a inveja do clitóris, estarão mais relacionadas com o sentimento de feminilidade inconsciente no homem, ou seja, com o arquétipo anima. Assim, pelo dito, na produção criativa do homem haverá uma diminuição do sentimento de masculinidade e uma acentuação do sentimento de feminilidade inconsciente.

 

Acrescente-se aqui, que, por contraponto, intui-se que para maior produção criativa da mulher, esta deverá identificar-se com o homem inspirado e inspirador, com a acentuação do seu sentimento de masculinidade inconsciente, e não apenas aquela externa ou externalizada.

 

Continuando o resumo, já aparte da referência a outros artigos, fazem-se agora elaborações, com destaque para os já referidos aspectos vivenciais e imaginários da vivência fetal, na relação com a mãe, e no útero desta, e com o pai.

 

Assim, considerando na criatividade, derivada da inveja do clitóris, a tentativa de diminuição narcísica, temos, imaginariamente, na identificação com o pai ou figura paterna, como que uma retrogressão, do feto em relação à distância relacional do pai em relação à mãe, em que poderemos enquadrar aqui a culpabilidade fálica, como que uma crítica psicológica do homem em relação à mulher, por esta, na inveja do pénis típica, ver o pénis enquanto falo. É importante a diferença relacional do feto em relação à mãe e do feto em relação ao pai. Já que a tentativa de diminuição narcísica advém do sentimento de superioridade sentido pelo homem na comparação pénis-clitóris, temos que naquela distância e diferença relacional, na retrogressão, o artista, na identificação com o pai, terá aquele sentimento como que advindo do próprio clitóris, daí a inveja do clitóris, já que não é um sentimento fálico, mas advindo, pelo contrário, da culpabilidade fálica do homem em relação à mulher, contrariando o falismo, tendo, deste modo, a mãe, e posteriormente, a mulher em geral, como referência de inspiração e criatividade, enquanto musa. Ocorrerá uma dupla identificação, com o pai, e com o próprio, imaginadamente no útero da mãe, em que temos, numa linha Winnicottiana, o útero enquanto espaço de ilusão por excelência, enquanto objecto transicional. Naquele distanciamento relacional referido, surge-nos então, o famoso gesto do artista utilizando o polegar, para medir distâncias e proporções, em relação à sua musa, paisagem, etc., em que temos que a relação entre o artista e a sua musa implicam um distanciamento relacional.

 

No distanciamento e diferença relacional referidos, temos um trabalho de diferenciação psíquica, em relação ao qual podemos enquadrar a contribuição de Margaret Mahler, como se pode ver no Dicionário de Psicopatologia da Criança e do Adolescente, de Houzel, Emmanuelli & Moggio, que nos descreve uma fase de separação-individuação, como sendo dois processos complementares, permitindo à criança sair da fusão simbiótica com a mãe, que caracteriza os primeiros meses de vida, em que até aos três anos passará por uma série de fases sucessivas durante as quais a criança investiria progressivamente a mãe e as funções do seu ego, adquirindo assim uma representação interiorizada de si própria, ligada mas distinta da representação do objecto.

 

Continuando o resumo, repare-se que, referindo-nos à conceptualização do objecto transicional por Winnicott, como indicado no Dicionário já mencionado, o objecto transicional, na criatividade, implica uma fase ou tempo de ilusão e uma fase ou tempo de desilusão, em que nesta última surge o objecto mais objectivado, numa verdadeira relação de objecto, partindo de uma fase de ilusão, em que os objectos são considerados extensões do ego, com um controlo omnipotente, numa relação fusional. Ora, na desilusão, ocorrem frustrações entre o que é esperado e o que é apresentado. Se da ilusão, começa-se a construir o espaço transicional, o objecto transicional, com estas frustrações, na desilusão, a relação de controlo omnipotente atenua-se para se instaurar progressivamente uma relação de objecto, entre seres separados e distintos, em que a área transicional torna-se progressivamente uma área partilhada, área intermediária de experiência, em que fenómenos, espaço e objectos trnasicionais começarão a ser desinvestidos e dissolvidos no domínio cultural, em que a experimentação interna subsistirá enquanto imaginação e trabalho criativo.

 

Ora, a vivência imaginada no feto, e a identificação do sujeito, do artista, com esta, está na linha do espaço de ilusão, da vivência de ilusão, numa relação fusional, e a identificação com o pai, que implica a frustração da saída da relação omnipotente no útero, na relação fusional, na diferença relacional relativamente à mãe e ao feto, enquanto próprio, está na linha da desilusão, em que o espaço transicional que terá sido o útero começa a ser desinvestido e começa a haver trabalho imaginativo e criativo, em que a mãe, e a mulher, em geral, nas identificações secundárias, continuam a ser fonte de inspiração, com o útero feminino enquanto espaço de ilusão e, precisamente, pela triangulação edipiana ocorrida, em que a mãe é vista enquanto ser separado e distinto, e o próprio imaginariamente no útero da mãe também é visto enquanto separado, e em que na identificação com o pai, e outros homens, nas identificações secundárias, ocorre uma desenfetização e uma desuterização.

 

Ora, ocorre a inveja do clitóris por o clitóris ser sinal de fonte criativa, ser sinal de início do processo criativo, e ocorre o sentimento de superioridade no homem pela mais fácil identificação, na triangulação edipiana, enquanto género, com o pai, figura paterna, e outros homens, permitindo a continuação e conclusão do mesmo processo criativo. Na mulher, e como se disse anteriormente, deverá haver diminuição da inveja do clitóris, esta, particularmente pela excitação sexual imaginada noutra mulher através do clitóris da mesma, diminuindo-se a diluição do poder criativo, com a escolha de uma ou poucas figuras de eleição, havendo posteriormente a identificação com o pai ou figura paterna, para também na triangulação edipiana haver a continuação e conclusão do processo criativo. Do mesmo modo, para a mulher, o clitóris será sinal de fonte criativa, sendo, contudo, mais difícil para a mesma sair do início do processo criativo, quer pela diluição do poder criativo nos comportamentos histéricos particularmente sexualizados nas relações sociais entre mulheres quer por a identificação posterior com o pai ou figura paterna ser mais difícil, na triangulação edipiana, por em termos de género ser mais difícil a passagem de objecto de amor materno para objecto de amor paterno, porquanto no homem o objecto de amor permanece em geral o mesmo, o materno.

 

Finalizado o resumo, e já para o presente artigo, tenha-se a noção da predominância do oro-falismo na mulher, com essa organização básica no histerismo, com a histeria mais tipicamente feminina, e com o sistema histérico capitalista, no âmbito do capitalismo global contemporâneo, no âmbito das respectivas sociedades falocêntricas actuais, baseadas no matriarcado que se apoia na sexualidade e psicossexualidade femininas.

 

Ora, para a mulher potenciar o seu poder criativo deverá desenvolver uma generosidade fálica, em que no distanciamento relacional relativamente ao homem inspirado e inspirador, este enquanto muso, por contraponto às habituais musas, há uma identificação, em que, partindo da noção de inveja do pénis, em que o pénis é tido como poder fálico, ocorre um tempo de ilusão, em que também a mulher tem em si própria a vivência do pénis enquanto falo, este enquanto falo poderoso, neste caso, na sobrecompensação do clitóris, e numa relação omnipotente, dual, com esse homem, passando-se a um tempo de desilusão, na generosidade fálica, que caracteriza-se pela tentativa de diminuição falo-narcísica, do homem para a mulher, e pela mulher, no distanciamento relacional, em que progressivamente o homem é visto com o pénis enquanto genital e a mulher com a vulva e vagina enquanto genital, com o real reconhecimento da diferença anatómica entre os sexos, em que a desilusão é a perda da noção do pénis enquanto falo todo-poderoso. A generosidade fálica, por contraponto à inveja do pénis, caracteriza-se, então, pela perda fálica e pela tentativa de diminuição falo-narcísica, com diminuição de exibicionismo e vaidade, por exemplo, traços eminentemente fálicos, com promoção destas características nos outros, daí a generosidade fálica. Repare-se que isto envolverá a noção já referida de culpabilidade fálica em relação à própria, culpabilidade em relação aos factores falo-sobrecompensatórios na mulher, particularmente na inveja do pénis. Isto nos leva também à diminuição da inveja do clitóris, considerando a sobrecompensação fálica uma sobrecompensação relativa ao clitóris, que caracterizará cada mulher, inveja que está relacionada com a percepção da excitação sexual que cada mulher sentirá com o clitóris, e percebido pela outra mulher, no âmbito das relações sociais tipicamente sexualizadas entre mulheres, em que a excitação sexual na mulher está associada a um factor sobrecompensatório. Esta diminuição da inveja do clitóris, com concentração da mesma, em uma ou poucas figuras de eleição, e inversão da histeria relacional, também potenciará o poder criativo da mulher, em que se tentará diminuir a excitação sexual associada a um factor sobrecompensatório.

 

Um exemplo de generosidade fálica é o de na Universidade, professores permitirem, particularmente em aulas prácticas, alunos apresentarem aulas, diminuindo exibicionismos nos próprios, com culpabilidade fálica de eventuais factores sobrecompensatórios associados à reputação académica e ao lugar de professorado universitário, e fomentando exibicionismos nos alunos, tendo nós também o exemplo de professores permitirem participação activa dos alunos nas aulas. Ou seja, com aulas menos expositivas e mais interactivas.

 

Aquele real reconhecimento da diferença anatómica entre os sexos faz lembrar uns versos da banda musical Tuxedo Moon: “ In heaven everything is fine, in heaven everything is fine, you’ve got yours baby, I’ve got mine !“.

 

 

Bibliografia

 

Resende, S. ( 2014 ). Inveja do clitóris e criatividade em www.psicologado.com               ( proposto a 01/2014 )

publicado por sergioresende às 10:51
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