Parte-se da relação estabelecida entre os psemes e os seus fundamentos perinatais e transpessoais, como se pode ver em Psemes: fundamentos perinatais e transpessoais ( Resende, 2012 ), para depois se fazer a associação entre psemes e genes ao nível da auto-replicância.
Como se pode verificar no artigo já referido, os psemes constituem-se enquanto unidades de evolução psicológica, como unidades psicológicas de transmissão intergeracional. Os mesmos psemes serão pensamentos inconscientes constituídos enquanto complexos, ou conjunto de complexos, inconscientes, complexos estes enquanto conjunto de disposições psicológicas, psicologica e significativamente relacionadas, numa linha Junguiana. Como se verá mais à frente, será ao nível de cada complexo que se estabelecerá a diferença com o conjunto de genes no ADN, ao nível da auto-replicância, já que é o ADN que se estabelecerá enquanto unidade biológica auto-replicante, e não cada gene( Dawkins, 1983, 1989, 2001, 2006 ). Continuando sobre os psemes, sendo estes objecto de evolução psicológica humana, os mesmos terão características Lamarckianas, no sentido dos complexos inconscientes poderem ser modificados durante a vida do indivíduo, com as modificações a serem transmitidas às gerações seguintes. Repare-se que estas modificações farão o papel de mutações psicológicas, similares às mutações biológicas. Além disso, os psemes caracterizam-se por serem transmitidos na sua totalidade. É de notar que os psemes se transmitirão por apreensões inconscientes, comportamentos, verbalizações, silêncios, etc.. Isto, postulando a maior ou menor relação destes fenómenos com pensamentos inconscientes subjacentes.
Ainda baseado naquele artigo referido, considere-se agora a relação de similitude entre os sistemas COEX, ou sistemas de experiência condensada, e as ideias de Jung quanto aos complexos psicológicos, estabelecida por Stanislav Grof, um dos fundadores da Psicologia Transpessoal, em seu A Psicologia do futuro ( 2007 ). Os COEX, cunhados por Grof, são encarados, por esse autor, como princípios organizadores gerais da psique humana. Os mesmos estão associados, para além dos dados biográficos pós-natais, a experiências perinatais ( trauma do nascimento ) e transpessoais. As experiências perinatais representarão uma entrada importante para o inconsciente colectivo, no sentido Junguiano, sucedendo que, segundo o autor, haverão interligações íntimas entre acontecimentos da nossa história biológica e os arquétipos Junguianos. Além disso, a identificação com a criança que passa a provação da passagem pelo canal de parto parece dar acesso a experiências que envolvem pessoas de outras épocas e culturas. Já as experiências transpessoais relacionam-se com experiências de vidas passadas, arquétipos Junguianos, e, em geral, com memórias ancestrais, raciais, colectivas e filogenéticas, experiências cármicas e com a dinâmica arquetípica. Concluindo este segmento, dir-se-à que os sistemas perinatais e transpessoais de Grof relacionam-se com os psemes, fundamentando a ideia de transmissão dos psemes ao longo das gerações.
Mas particularmente importante para este artigo, será a referência que Grof ( 2007 ) faz, quando ele diz que quando se estabelece um sistema COEX, ele tem uma propensão auto-replicante e pode levar o indivíduo a recriar inconscientemente situações de um tipo semelhante, e assim adicionar novas camadas à constelação de memórias.
Estabeleceríamos, então, uma relação de diferença entre os genes biológicos e os psemes psicológicos ( psemes, pela similitude entre complexos psicológicos e sistemas COEX ), em que não é o gene mas, como já dito, o ADN, no seu todo, que se auto-replica, enquanto que será cada complexo, ou pseme, que será, então, a unidade psicológica auto-replicante.
Psicologicamente, o conceito de auto-replicação dos sistemas COEX, e, coerentemente, dos psemes, aproxima-se da noção de compulsão à repetição, tão utilizada na orientação psicanalítica. Embora esteja mais associado à psicopatologia, dir-se-à que os complexos psicológicos, ou psemes, repetir-se-ão ao nível da compulsão à repetição.
Vejamos a definição de compulsão à repetição, feita por Laplanche & Pontalis ( 1990, p. 88 ): “ A) Ao nível da psicopatologia concreta, processo incoercível e de origem inconsciente, pelo qual o indivíduo se coloca activamente em situações penosas, repetindo assim experiências antigas sem se recordar do protótipo e tendo pelo contrário a impressão muita viva de que se trata de algo de plenamente motivado na actualidade; B) Na elaboração teórica que Freud lhe dá, a compulsão à repetição é considerada um factor autónomo, irredutível em última análise a uma dinâmica conflitual onde não interviesse senão o funcionamento conjugado do princípio do prazer e do princípio da realidade. Ela é referida fundamentalmente ao carácter mais geral das pulsões: a sua característica conservadora. “.
Para o contexto deste artigo, realço da definição, e coerentemente, o ser incoercível, de origem inconsciente, o repetir de experiências antigas e a sua tendência conservadora. Quanto a esta tendência, é como se houvesse uma tradição psíquica ao nível da transmissão dos psemes.
Para além desta tradição psíquica, teríamos, também, como já dito, as tais mutações psicológicas, as modificações dos psemes, que também são transmitidas às gerações seguintes. Por último, e para resumir, propõe-se a semelhança de haver auto-replicância, quer biológica quer psicológica, mas com a diferença de que será ao nível do ADN, no seu todo, que esse processo se passa, e não ao nível de cada gene, enquanto que, psicologicamente, será ao nível de cada pseme que a auto-replicância se passa, sendo cada unidade dessas uma unidade psicológica auto-replicante.
Bibliografia
Dawkins, R. ( 1983 ). The Extended Phenotype: the long reach of the gene ( original de 1982 ). Oxford University
Dawkins, R. ( 1989 ). O gene egoísta ( original de 1976 ). Gradiva
Dawkins, R. ( 2001 ). River out of Eden ( original de 1995 ). Phoenix, Orion Books, Ltd
Dawkins, R. ( 2006 ). The blind watchmaker ( original de 1986 ). London: Penguin Books, Ltd
Grof, S. ( 2007 ). A Psicologia do future. Via Ótima
Laplanche, J. & Pontalis, J. B. ( 1990 ). Vocabulário da Psicanálise. Editorial Presença
Resende, S. ( 2012 ). Psemes: fundamentos perinatais e transpessoais em www.psicologado.com ( em apreciação )
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